Wednesday 26 February 2014

Desejo de Conhecimento




por Sophia de Mello Breyner Andresen


CAMINHO DA ÍNDIA

II

Que no largo mar azul se perca o vento
E nossa seja a nossa própria imagem.

Desejo de conhecimento
As tempestades deram-nos passagem.

E os lemes quebrados dos capitães mortos
E os náufragos azuis do fim do mundo
Na rota de todos os portos
No fundo do mar profundo
Com os seus braços ossos
E seus verdes destroços
Marcaram o caminho.




Descobri a incapacidade que o mundo tem para cuidar ('to care for')
quando a Teresa dormiu a primeira noite na maternidade.


E as mães que não têm leite?
Onde não há Nestlé nem latas nem biberons nem nada?


Quando regressei de Cabo Verde em 1998
senti pela primeira vez que vivia num país rico.
Nunca consegui entender como é que as pessoas se alimentavam
sem agricultura, sem água, sem dinheiro. 
Mas o facto é que não se morre de fome na aldeia onde vivi 5 semanas.

Essa experiência de viver do desconhecido
influenciou-me até hoje, pois mesmo quando a Teresa
está longe de mim, há um sentimento preponderante que ela está bem,
mas que eu só posso experimentar porque a Teresa existe e eu a amo.
Só é possível confiar e conhecer quando há alguma coisa
ou alguma pessoa que nós podemos perder.
É pela necessidade que crescemos, 
pelo combate que essa necessidade nos traz.
Pois confiar é, de facto, um combate.
Educar não é um facto económico que se observa num determinado momento t,
como estudei na faculdade. Não é ser um nome no registo civil da Teresa
que indica que eu sou Mãe dela. Educar é ser um caminho na realidade da Teresa.
Não-Educar é estar ausente da realidade da Teresa.

As pessoas que não têm necessidades nunca podem crescer,
pois não precisam de confiar nos outros.
Tudo o que tenho vem de outros e de Outro. 
E assim, também quem não tem a experiência de PERDER 
que é aquilo que dá sentido à POSSE, ao desejo, ao ganho,
não é capaz de atribuir VALOR.

Hoje acordei a pensar que muito do que aprendi até hoje já não é útil para o que eu preciso.
Será loucura, isto que sinto? É que até ontem eu achava que era o ar com que eu respirava.
O meu modelo de vida actual já não realiza o que eu precisava de sentir no passado.
Mais uma vez preciso de começar.
Mas as pessoas que eu trouxe da maternidade ficaram para me ver crescer,
ficaram para crescer,
somos as mesmas pessoas que já se perderam e continuam juntas 
Aumentando-se












 




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